domingo, 7 de março de 2010

"V- Há Metafísica Bastante em Não Pensar em Nada"


O que penso eu do mundo?
Sei lá o que penso do mundo!
Se eu adoecesse pensaria nisso.

Que idéia tenho eu das cousas?
Que opinião tenho sobre as causas e os efeitos?
Que tenho eu meditado sobre Deus e a alma
E sobre a criação do Mundo?

Não sei. Para mim pensar nisso é fechar os olhos
E não pensar. É correr as cortinas
Da minha janela (mas ela não tem cortinas).

O mistério das cousas? Sei lá o que é mistério!
O único mistério é haver quem pense no mistério.
Quem está ao sol e fecha os olhos,
Começa a não saber o que é o sol
E a pensar muitas cousas cheias de calor.
Mas abre os olhos e vê o sol,
E já não pode pensar em nada,
Porque a luz do sol vale mais que os pensamentos
De todos os filósofos e de todos os poetas.
A luz do sol não sabe o que faz
E por isso não erra e é comum e boa.

Metafísica? Que metafísica têm aquelas árvores?
A de serem verdes e copadas e de terem ramos
E a de dar fruto na sua hora, o que não nos faz pensar,
A nós, que não sabemos dar por elas.
Mas que melhor metafísica que a delas,
Que é a de não saber para que vivem
Nem saber que o não sabem?

"Constituição íntima das cousas"...
"Sentido íntimo do Universo"...
Tudo isto é falso, tudo isto não quer dizer nada.
É incrível que se possa pensar em cousas dessas.
É como pensar em razões e fins
Quando o começo da manhã está raiando, e pelos lados das árvores
Um vago ouro lustroso vai perdendo a escuridão.

Pensar no sentido íntimo das cousas
É acrescentado, como pensar na saúde
Ou levar um copo à água das fontes.

O único sentido íntimo das cousas
É elas não terem sentido íntimo nenhum.
Não acredito em Deus porque nunca o vi.
Se ele quisesse que eu acreditasse nele,
Sem dúvida que viria falar comigo
E entraria pela minha porta dentro
Dizendo-me, Aqui estou!

(Isto é talvez ridículo aos ouvidos
De quem, por não saber o que é olhar para as cousas,
Não compreende quem fala delas
Com o modo de falar que reparar para elas ensina.)

Mas se Deus é as flores e as árvores
E os montes e sol e o luar,
Então acredito nele,
Então acredito nele a toda a hora,
E a minha vida é toda uma oração e uma missa,
E uma comunhão com os olhos e pelos ouvidos.

Mas se Deus é as árvores e as flores
E os montes e o luar e o sol,
Para que lhe chamo eu Deus?
Chamo-lhe flores e árvores e montes e sol e luar;
Porque, se ele se fez, para eu o ver,
Sol e luar e flores e árvores e montes,
Se ele me aparece como sendo árvores e montes
E luar e sol e flores,
É que ele quer que eu o conheça
Como árvores e montes e flores e luar e sol.

E por isso eu obedeço-lhe,
(Que mais sei eu de Deus que Deus de si próprio?).
Obedeço-lhe a viver, espontaneamente,
Como quem abre os olhos e vê,
E chamo-lhe luar e sol e flores e árvores e montes,
E amo-o sem pensar nele,
E penso-o vendo e ouvindo,
E ando com ele a toda a hora.

Alberto Caeiro - O Guardador de Rebanhos 

"Prisioneiros da cadeira"


Homens foram feitos para andar, mas passam o dia todo sentados, diz médico

O corpo do Homo sapiens foi moldado para o movimento. Para caçar, nadar, plantar e sobretudo, caminhar. Mas mudamos radicalmente nosso estilo de vida nos últimos anos, tornando-nos cada vez mais sedentários. Atualmente, a maioria da população passa grande parte do tempo sentada. São em média, 10 a 15 horas por dia no carro ou ônibus, no trabalho, em frente a TV. Sem falar nas horas de sono. As pessoas praticamente não andam mais e se movimentam muito pouco, constata o endocrinologista James Levine, da Clínica Mayo, em Rochester, nos EUA, que há dez anos estuda o papel dos movimentos cotidianos (atividades que queimam calorias mas não são exercícios físicos) em nosso metabolismo.
O especialista, autor de "Mexa-se um pouco, emagreça muito" (Ed Rocco), fez a fascinante descoberta: as pessoas que se movimentam mais queimam até 350 calorias extras por dia, o equivalente a mais  de 15 kilos por ano. Por isso, acredita, a epidemia de obesidade estaria diretamente ligada à imobilidade do homem moderno. E de nada adianta ir com frequência  à academia  ou mesmo fazer uma corrida matinal, segundo o especialista, se, ao longo de todo o restante do dia, permanecemos sentados. O risco de engordar e de desenvolver problemas cardíacos e doenças como diabetes permanecerá elevado. Em resumo, passar muito tempo sentado é ruim para a silhueta e a saúde. "Nossos ancentrais queimavam tudo o que ingeriam se deslocando, buscando alimento, procurando abrigo, se reproduzindo. Alteramos a nossa maneira natural de viver e nos aprisonamos em cadeiras, atrás de computadores", afirma Levine. A solução deve ser nos tornarmos naturalmente mais ativos."

Dicas de movimento:
Para o endocrinologista James Lavine, ir à academia é muito bom, mas é preciso também inserir mais movimento no dia a dia. Veja como fazer isso em casa e no trabalho.
-A caminho do trabalho: Se der para abrir mão do transporte, caminhe para o trabalho. Se for muito longe, busque estacionar a alguns quarteirões de distância ou descer um ponto antes.
-Escadas: Tente não usar elevador. Encare os degraus.
-Reunião: Faça as reuniões caminhando, em vez de sentado. São 100 calorias extras por hora. Se não der, ao menos fique de pé.
-E-mails: Em vez de mandar um e-mail para uma pessoa que trabalha no mesmo escritório, ande até ela.
-Telefone: Procure sempre caminhar enquanto fala ao telefone.
-Almoço: Procure caminhar durante uma parte da hora do almoço. Junte os amigos e faça um passeio.
-Jantar: Adicione 20 minutos de caminhada antes do jantar. Ou retome o hábito de dar uma volta depois da comida.

Fonte: "Jornal O Globo" do dia 28 de fevereiro de 2010. 

sábado, 6 de março de 2010

"Canção na Plenitude"

Não tenho mais os olhos de menina
nem corpo adolescente, e a pele
translúcida há muito se manchou.
Há rugas onde havia sedas, sou uma estrutura
agrandada pelos anos e o peso dos fardos
bons ou ruins.
(Carreguei muitos com gosto e alguns com rebeldia.)

O que te posso dar é mais que tudo
o que perdi: dou-te os meus ganhos.
A maturidade que consegue rir
quando em outros tempos choraria,
busca te agradar
quando antigamente quereria
apenas ser amada.
Posso dar-te muito mais do que beleza
e juventude agora: esses dourados anos
me ensinaram a amar melhor, com mais paciência
e não menos ardor, a entender-te
se precisas, a aguardar-te quando vais,
a dar-te regaço de amante e colo de amiga,
e sobretudo força — que vem do aprendizado.
Isso posso te dar: um mar antigo e confiável
cujas marés — mesmo se fogem — retornam,
cujas correntes ocultas não levam destroços
mas o sonho interminável das sereias.


O texto acima foi extraído do livro "Secreta Mirada", Editora Mandarim - São Paulo, 1997, pág. 151.

A Suave Subversão da Velhice"



Uma ótima reportagem para lerem da jornalista Eliana Brum!
Boa leitura à todos!
Abraços,
Dra Nazaré 


http://epoca.globo.com/edic/20011224/especial1a.htm